Sunday, July 04, 2010

Um googolplex de criatividade



"Quando achei que estava morrendo na base da ponte Loschwitz, pouco depois do bombardeio a Dresden, um único pensamento ocupava minha mente: Continue pensando. O pensamento me manteria vivo. Mas agora estou vivo e o pensamento está me matando. Penso, penso, penso. Não consigo parar de pensar naquela noite, o céu como água negra, e como eu tinha tudo poucas horas antes de perder tudo. Sua tia me dissera que estava grávida, fiquei exultante, devia ter aprendido a não confiar nisso, cem anos de alegria podem ser apagados em um segundo(...)

Quando sua mãe me encontrou na padaria da Broadway, eu quis contar tudo para ela. Se eu tivesse conseguido, talvez nossa vida tivesse sido diferente, talvez eu estivesse aí com vocês e não aqui. Se eu tivesse dito "Perdi um bebê"... se eu tivesse dito "Tenho tanto medo de perder algo que amo que me recuso a amar qualquer coisa", talvez isso pudesse tornar possível o impossível, mas não consegui. Eu tinha enterrado muita coisa dentro de mim, fundo demais. E aqui estou eu, ao invés de aí. Estou sentado nessa biblioteca, a milhares de kilômetros de minha vida, escrevendo mais uma carta que sei que não poderei enviar. Como aquele rapaz fazendo amor atrás do galpão se tornou este senhor solitário escrevendo esta carta nessa mesa?

Amo você,
Seu pai."


(Extremamente Alto & Incrivelmente Perto)

Se você tem interesse em Literatura(de verdade, não as séries de "livros" sobre vampirinhos cristãos, conservadores e adolescentes - ou bruxinhos), mas não sabe exatamente por onde começar, eu lhe dou uma dica: Os dois livros de Jonathan Safran Foer.

O jovem escritor nova-iorquino, que já saiu da lista de "promessas da literatura" para se firmar como um dos grandes novos nomes da narrativa, escreveu três livros, os dois romances Extremamente Alto & Incrivelmente Perto e Tudo se Ilumina(que virou filme, sob o título de "Uma Vida Iluminada", também ótimo por sinal), e o livro de não-ficção Eating Animals, ainda sem tradução. Em poucas palavras: Jonathan Safran Foer é aquele escritor que te faz lembrar do motivo pelo qual você gosta de ler, ou então, o que te faz começar a gostar de ler.

Talvez meu livro favorito, dentre todos que já li, seja Extremamente Alto & Incrivelmente Perto. A narrativa de Foer é diferente, utiliza da fantasia como metáfora para explicar a realidade. E sempre de forma bem-humorada. Um livro que utiliza de diversos métodos para contar a história de um garoto que tenta superar a morte do pai após os atentados de 11 de Setembro em Nova York, ligando à história de seus antepassados, desde o bombardeio à pacífica cidade de Dresden - Alemanha, na Segunda Guerra Mundial. Um ótimo livro, amplamente divulgado como sendo literatura pós-moderna(truques de linguagem, jogos de espelho e contrapontos temporais), sobre como as pessoas lidam com a morte e com a perda, mas sem soar triste. O livro está em processo de adaptação para o cinema.

Tudo se Ilumina, muitos já devem ter visto sua adaptação para o cinema, com o Ellijah Wood e o Eugene Hutz(vocalista do Gogol Bordello). Ao tratar o holocausto de uma forma completamente não-ortodoxa(baseando-se, de forma completamente surreal, numa experiência própria do autor), o livro versa sobre o comportamento judaico de aplicar os precedentes e conhecimentos criados pelos antepassados na vida cotidiana, de forma que o passado seja aplicado no presente, assim iluminando o futuro.

Se você quer rir, sentir, viver, chorar e se esbaldar de tanta criatividade, procure um caminho alternativo à lista dos mais vendidos das livrarias do país. Procure por Jonathan Safran Foer. Narrativa inteligente, super-criativa e bastante apropriada para o público jovem. Dica do mês, ok.

"À noite ele se realizava: sozinho na magnitude do seu pesar, sozinho com sua culpa difusa, sozinho até na sua solidão. Não estou triste, repetia ele sem parar. Não estou triste. Como se um dia pudesse se convencer disso. Ou se enganar. Ou convencer os outros - a única coisa pior do que ficar triste é deixar os outros descobrirem que você está triste. Não estou triste. Não estou triste. Pois sua vida tinha um potencial ilimitado para a felicidade, exatamente por ser um aposento branco e vazio.

Ele adormecia com o coração ao pé da cama, feito um animal domesticado que não fazia parte dele. E a cada manhã acordava com o coração engaiolado novamente nas costelas, um pouco mais pesado, um pouco mais fraco, mas ainda bombeando. E lá pelo meio da tarde sentia o desejo de estar em outro lugar, de ser outra pessoa, de ser outra pessoa que estivesse em outro lugar. Não estou triste."


(Tudo Se Ilumina)

1 comment:

Acássio said...

Safran Foer é realmente um escritor MUITO BOM (em letras maiúsculas mesmo!) Li os dois livros dele e ambos estão no meu Top5, outro dia eu vi uma garota no ônibus lendo Extremamente Alto e Incrivelmente perto, dai eu sentei perto dela, só pra reler pedaços, de tão lindo que é.

:)
Texto muito bom, Jair.
Parabéns