Friday, December 18, 2009

O que é Brasil


Recusei-me a comentar sobre o caso da "Loira da Uniban", a garota insultada por vários alunos e expulsa de sua universidade por ter ido a uma aula com um vestido um tanto quanto curto. Simplesmente porque acho que a garota já conseguiu muito mais do que objetivava de início: aparecer. Ela conseguiu isto, só que em proporções muito maiores. Continuarei sem lançar minha opinião sobre o comportamento da menina ou da universidade; só versarei um pouco sobre o que tem sido dito sobre o sucedido.

Boa parte dos seguidores da cartilha do politicamente correto vêm criticando com força a Universidade e os alunos da mesma por terem insultado a "coitada", e pelo menos 70% dos argumentos que tenho ouvido/lido dizem algo semelhante a isto: "uma mulher ser julgada por estar de vestido curto no BRASIL? O país do nudismo, da mulata sambando semi-nua, da garota de Ipanema!". Bem, é isto que me irrita.

O que é Brasil? Você, como brasileiro, tem noção alguma disto? Tem certeza de que esta é a terra do samba e do carnaval? E da garota de Ipanema com os glúteos volumosos? Então você não conhece absolutamente nada do lugar em que vive, perdão.

A pintura que postei acima é do artista francês Adrien Taunay, chama-se "Vestimentas de São Paulo", datada de 1825. Tratou-se da missão em que artistas franceses retratavam costumes do povo brasileiro, e no caso, da cidade de São Paulo, a maior do país. Perebe-se logo de cara que as moças solteiras utilizavam uma burca preta muito semelhante à dos países islâmicos, e a senhora casada, simplesmente um vestido muito longo. Sim, eu sei que essa pintura é de muito tempo atrás, mas... é compatível com a imagem que tem a mulher brasileira para a mídia e grande órgãos de comunicação?

Pois bem, a padronização do Brasil como se fosse uma grande cidade do Rio de Janeiro é algo de interesse de órgãos de turismo e de coorporações como a Rede Globo, que tem sede na capital fluminense. Oras, a Globo afirma tanto o Brasil ser o país do samba e do carnaval. Bem, eu moro numa metrópole do nordeste, e aqui, seja em Natal, Fortaleza ou João Pessoa, se você for num final de semana procurar alguma casa de música que esteja executando o samba, você achará pouquíssimas, contando nos dedos, e cada uma com mínimos visitantes. E tenho certeza absoluta que é da mesma forma em Curitiba, Porto Alegre, Goiânia... E sobre a maior cidade do Brasil, São Paulo, eu cito Vinícius de Morais: São Paulo é o túmulo do samba - claro que esta afirmação é um exagero, mas muito menor do que dizer que no Brasil o que se predomina é o samba.

De Norte a Sul, do Rock N' Roll ao Forró, da Música Gaudéria à Sertaneja, as manifestações musicais que acontecem no Brasil(originadas aqui ou não) transformam-se muito de local a local.

Por mim, tudo bem ver um turista norueguês que vem aqui pra minha cidade atrás de praia e sol achar que o Brasil se trata disso, afinal, ele não sabe de nada do país. Também consigo compreender um órgão demoníaco como a Rede Globo querendo padronizar o Brasil - um país de 190 milhões de habitantes - num grande Rio de Janeiro, como se fosse uma novela do Manoel Carlos; o que eu fico realmente irritado é quando os próprios brasileiros(principalmente os que se dizem intelectuais) afirmam ser este o país simplesmente da preguiça, caipirinha e carnaval. É quando me dou conta do quão cercado de idiotas eu estou.

Repito a pergunta: você sabe o que é Brasil? Sabe o que é cultura brasileira? Você sabe o que foi a semana de arte moderna de São Paulo? Sabe o que é a festa do Boi Caprichoso, do Amazonas? Você sabe que em uma metrópole do Brasil chamada Curitiba povos como ucranianos, japoneses, alemães, poloneses e africanos convivem em perfeita harmonia? Sabe quem foi Villa-Lobos? Carlos Gomes? Menotti Del Picchia? Já leu Machado de Assis?

Não sou patriota, não mesmo. Mas antes de sair afirmando por aí que neste lugar só existe samba, sacanagem e futebol; pesquise um pouco, nem que seja na Wikipédia, para não falar MERDA!

Thursday, December 03, 2009

Como desaparecer completamente...



Em determinado momento do livro "O Apanhador no Campo de Centeio", clássico da literatura norte-americana, o protagonista, o adolescente Holden Caulfield, depois de uma série de eventos que fizeram-no perder o que restava de sua pouca fé na humanidade, entrou em uma depressão profunda, começou a planejar sua vida fora daquele cotidiano que o artodoava - de idiotas marombeiros maníacos por carros e sexo à pessoas sem noção que pichavam a palavra "Fuck!" numa escola para crianças. A vida que ele pretendia seguir para fugir de todas essas pessoas era se mandar para qualquer fazenda, ser um trabalhador braçal recluso e fingir que era surdo-mudo para nunca mais conversar com qualquer ser-humano. De certa forma, o plano de Caulfield era simplesmente uma negação de sua vida, de suas origens, e acima de tudo; uma negação da realidade. Tanto que em certa passagem, durante este momento descrito, ele pede à alma de seu irmão mais novo falecido "Por favor, allie, não me deixe desaparecer; não me deixe desaparecer"... devido à sensação de estar num processo de desaparecimento lento, descrito por ele. Em essência, é assim que eu me sinto.

Por diversos motivos advindos de um cotidiano insuportavelmente besta, fica mais confortante repetir para si mesmo, como diz o Thom Yorke em uma de suas músicas mais belas - How to disappear completely - "Eu não estou aqui. Isto não está acontecendo... Em pouco tempo, eu já terei sumido". É impressionante o efeito que faz ficar repetindo isto para si mesmo. Não duvide do poder da negação. Rejeitar a realidade faz da existência um lugar mais suportável, pois o mundo não é um lugar seguro, todos nós sabemos disso.

Ironicamente, sempre acreditei no poder de cura do pessimismo. Reconhecer-se como uma insignificante micropartícula diante da imensidão inimaginável do Universo nos faz aceitar a vida de fato e as condições que nos são impostas. E negar o sentido de tudo, acredite, desestressa bastante. A sua e a nossa pseudo-felicidade(farsas, como todas) não é atingida, mas boa parte do sofrimento inútil nos é subtraída.

Enfim, tudo isso aqui dito não passa daquilo que melhor sei fazer na vida, complicar algo descomplicável: o nada. Encher de palavras para conceituar algo que não se dá para conceituar. Capturar essências vazias no ar e transformá-las em pseudo-filosofia, ou tentar achar algum valor estético na depressão. Mas não posso evitar, acho que nasci para isso, para essas levianidades bobas, pois é mais fácil escrever tudo isto para negar a vida do que vivê-la de fato, menos sofrimento, é a minha forma de desaparecer completamente. Aqui nesta casamata eu me sinto mais vivo e tudo me é permitido.


"A vida é uma perturbação inútil na imensidão de tranqüilidade que é o nada".

Artur Schopenhauer.